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descrever o meu blog é uma tarefa quase impossível...

Agora Margarida Rebelo Pinto e o Futebol

terça-feira, agosto 01, 2006

Ontem foi Maitê Proença, hoje Margarida Rebelo Pinto, as diferenças de uma brazuka para uma tuga, em relação ao futebol, aqui vai:

Essa coisa linda que é o futebol

Já me apaixonei algumas vezes, mas foi sempre por pessoas, causas, ideias, às vezes poemas, outras livros. O entusiasmo é um traço característico do ser humano, por isso aquilo que pensamos que pode ser uma paixão às vezes não passa de um momento de euforia que se desfaz à velocidade de um fósforo aceso, dissipando-se para sempre e deixando na memória não mais que um resquício de uma recordação vaga e confusa que se esbate com o tempo até se apagar para sempre.
O que não entendo é a paixão por uma coisa tão estranha como o futebol. Não me interpretem mal. Eu gosto de ver um bom desafio e fico feliz quando o meu clube, de seu nome Benfica e cognome o Glorioso vence uma partida. Mas se por acaso ele perde, termino o bife que me espera no prato e não penso mais no assunto. Não perco o apetite nem a falta de sono, por isso fico esmagada quando vejo os adeptos a chorar, a gritar e a rasgar camisolas depois de uma derrota. E ainda mais entristecida fico quando sei que, depois de uma derrota, há muitas mulheres por esse mundo fora que pagam as favas por um frango azarado ou um remate que o Diabo desviou da baliza. Afinal o que tem o futebol de tão extraordinário que altere de forma tão profunda a vida das pessoas? Provavelmente nunca o saberei.
Se calhar é porque sou mulher. As mulheres não vêm futebol da mesma maneira que os homens. Eles dizem palavrões, nós dizemos ai meu Deus. Eles gritam, nós rangemos os dentes. Eles insultam o adversário numa falta, nós dizemos ai,ai, coitadinho do Figo que vai ficar com a cara num bolo, quando este sofreu um pontapé na cara do... no jogo contra a França. Claro que uma mulher pode viver com intensidade uma partida, mas só uma mulher é que pode reflectir sobre a razão pela qual o Victor Baía, guarda redes da selecção de Portugal no Campeonato Europeu, usa risca ao meio e uma fita no cabelo no exacto momento em que ele está a tentar defender um penalty. Foi o que aconteceu quando Portugal perdeu frente à França na última competição Europeia em Junho de 2000. Senti-me ridícula por pensar no penteado do rapaz num momento tão crucial como aquele que significava a nossa eliminação definitiva da vitória do campeonato, mas foi mesmo isto que aconteceu.
Como tentava explicar, nós vemos mesmo o futebol de forma diferente dos
homens, porque como isto é uma coisa de homens e por isso,
por mais que o mulherio se esforce por perceber, sabe sempre a conversa de
homem. Vou-vos dar um exemplo; já me explicaram duas vezes o que é um fora de jogo e eu nunca consegui perceber. Será que sou burra? Não, sou apenas mulher. E quanto à lógica das diferentes competições, embora distinga entre a primeira e a segunda divisão, só fixei a palavra jornadas. Mas podia ser
pior. Podia não saber quantos é que estão em campo, achar que o cartão
amarelo é uma promoção de um refrigerante e que o vermelho faz parte de uma campanha desesperada de um partido de extrema esquerda. Como sempre ouvi dizer que o futebol e a política andam de mãos dadas, talvez a minha imaginação não esteja assim tão longe da realidade quanto isso...
Voltando ao jogo, isto do futebol é com o amor, quando se vive com paixão,
Sofre-se muito. Mas o que é que se ama e por quem se sofre ? Pelo clube? E o que é um clube senão um conjunto de gente que aspira pela vitória de uma sigla? Deve ser aqui que entra aquilo a que se chama a massa associativa, formada pelos adeptos, esses seres devotos ao clube para quem o futebol é uma coisa importante.
Com 35 anos e uma carreira que fez de mim uma mulher independente antes dos 25, sou o protótipo de uma geração de mulheres emancipadas para quem tirar um curso superior e construir uma carreira foi um processo de evolução não só natural, como quase obrigatório. Não precisei de me armar de princípios feministas para ter o meu lugar no mundo do trabalho. A esta geração que pertenço, entre os yupees e os New Age, foi-nos incutido desde pequenos que, salvo as diferenças anatómicas, éramos todos iguais. Andei em escolas mistas, pratiquei desportos mistos, cresci num mundo onde rapazes e raparigas já não eram separados, a não ser nos balneários ou pela ordem natural das coisas, como o facto deles tendencialmente preferirem jogar futebol em vez de ir aos saldos e nós preferirmos ir aos saldos em vez de nos pormos a correr que nem umas tontas atrás de uma bola.
Embora sabendo desde pequenos a distinção entre meninos e meninas, habituámo-nos à ideia que somos iguais em capacidades e oportunidades. Mas não é assim. Se Deus quisesse que fossemos todos iguais, não nos tinha feito diferentes. Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa. Uma mulher é e será sempre uma mulher, um homem é e será sempre um homem. Parece redundante, mas é importante lembrar as coisas mais óbvias que passam pelo simples facto de uma mulher gostar de ir ao cabeleireiro, contar a sua vida íntima às amigas, suspirar por uma carteira de marca e sonhar com o príncipe encantado parecido com o Paul Newman e um homem ter barba, gostar de ir beber cervejas com os amigos, isolar-se quando tem um problema e sonhar com uma mulher bem feita que goste de sexo.
Alguém disse um dia que um homem ama aquilo que deseja e uma mulher deseja aquilo que ama. Esta frase que paira no meu espírito há mais de dez anos, diz muito sobre as diferentes naturezas, feminina e masculina. E, voltando à temática do futebol, percebo que as mulheres, filhas ou esposas de adeptos, adquiram por via cultural a paixão pelo desporto rei, mas tenho algumas dúvidas que essas mesmas mulheres, em pequenas, preferissem dar pontapés numa bola a pentear uma boneca. Da mesma forma que será, com toda a certeza mais fácil entusiasmar uma menina de sete anos a tricotar uma camisola do que um rapazola, fascinado com os golpes de judo que aprende nas escola ou com os amigos do bairro.
O futebol pode ser uma paixão, mas é maioritariamente uma paixão masculina. A propósito: porque é que o Victor Baía usa risco ao meio?

Margarida Rebelo Pinto

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